IBS e CBS – Os Novos Tributos sobre Consumo da Reforma Tributária
Como funcionam, alíquotas, não cumulatividade plena e o longo período de transição até 2033
A reforma tributária brasileira, promulgada através da Emenda Constitucional 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar 214 de janeiro de 2025, representa a mais profunda transformação do sistema tributário nacional desde a Constituição de 1988. No centro dessa reforma estão dois novos tributos que substituirão cinco impostos atuais: o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Juntos, esses tributos formam o chamado IVA Dual brasileiro, modelo inspirado em práticas internacionais mas adaptado às particularidades federativas do país.
A partir de 2026, inicia-se um longo período de transição que se estenderá até 2033, durante o qual o sistema tributário atual coexistirá com o novo modelo. Essa convivência temporária de dois sistemas paralelos representa desafio operacional imenso para empresas de todos os portes, que precisarão adaptar sistemas, processos e equipes para lidar simultaneamente com regras tributárias antigas e novas. Compreender profundamente o funcionamento técnico do IBS e da CBS deixou de ser conhecimento especializado para tornar-se competência essencial de gestores, contadores e empresários.
O que são IBS e CBS e por que existem dois tributos
O IBS é o Imposto sobre Bens e Serviços de competência compartilhada entre estados e municípios, substituindo o ICMS e o ISS. A CBS é a Contribuição sobre Bens e Serviços de competência federal, substituindo PIS, COFINS e IPI. A opção por criar dois tributos distintos ao invés de um único IVA federal reflete a estrutura federativa brasileira e a necessidade de preservar autonomia tributária de estados e municípios.
A distinção entre IBS e CBS não é meramente formal. Embora ambos funcionem tecnicamente de forma praticamente idêntica, possuem competências tributárias, administrações e destinos de arrecadação diferentes. A competência para fiscalização e cobrança do IBS é compartilhada entre estados, Distrito Federal e municípios através de um Comitê Gestor, enquanto a CBS permanece sob competência exclusiva da Receita Federal.
O IBS será gerido por uma estrutura inédita no país: o Comitê Gestor do IBS, órgão colegiado com representação paritária de estados e municípios, responsável por harmonizar procedimentos, definir alíquotas de referência e administrar a plataforma tecnológica unificada de arrecadação. Essa governança compartilhada busca evitar a guerra fiscal que caracterizou o ICMS nas últimas décadas, onde estados competiam através de concessão indiscriminada de benefícios fiscais.
Fato gerador amplo e incidência abrangente
O IBS e a CBS incidem sobre todas as operações onerosas que tenham por objeto bens e serviços. As operações compreendem o fornecimento de bens e serviços e podem decorrer de qualquer ato ou negócio jurídico. Essa redação ampla marca mudança conceitual profunda em relação ao sistema atual, onde existem distinções rígidas entre circulação de mercadorias, prestação de serviços e industrialização.
No novo modelo, deixa de existir a diferenciação tradicional entre mercadoria e serviço para fins tributários. Toda operação que não seja classificada como fornecimento de bem material ou imaterial será considerada como operação com serviço. Essa simplificação elimina discussões intermináveis sobre natureza jurídica de determinadas operações, fonte de litígios bilionários no sistema atual.
O momento da incidência dos tributos ocorre, em regra, quando realizado o fornecimento do bem ou serviço. Nas operações de execução continuada ou fracionada em que não seja possível identificar o momento do fornecimento, os tributos incidem quando devido o pagamento. Caso ocorra pagamento integral ou parcial antes do fornecimento, o pagamento dos tributos deverá ocorrer antecipadamente na data de pagamento.
Operações não onerosas, em regra, não são tributadas, mas a legislação estabelece exceções importantes. São tributados o fornecimento não oneroso ou com valor inferior ao de mercado de bens e serviços em situações específicas, como transferência de bens a sócios não contribuintes do regime regular quando a aquisição desses bens tenha gerado créditos para o contribuinte, e fornecimentos não onerosos realizados por um contribuinte a uma parte relacionada. Essas regras visam impedir planejamentos tributários que utilizem operações sem contraprestação para transferir valores sem tributação.
Base de cálculo e o princípio do valor cheio
A base de cálculo do IBS e da CBS será o valor total da operação, salvo disposição diferente na legislação. Esse valor engloba o montante integral cobrado pelo fornecedor, independentemente da natureza, incluindo acréscimos decorrentes de ajuste do valor da operação. Esse princípio, conhecido como “valor cheio” ou “por fora”, significa que os tributos não integram sua própria base de cálculo.
Durante o período de transição, de 1º de janeiro de 2026 a 31 de dezembro de 2032, são excluídos da base de cálculo do IBS e da CBS o montante do ISS, ICMS, PIS e COFINS. Essa exclusão é essencial para evitar dupla tributação durante o período em que os sistemas convivem. Após 2033, quando o sistema antigo estiver completamente extinto, apenas o próprio IBS e CBS serão excluídos da base de cálculo um do outro.
Em alguns casos, a base de cálculo corresponderá ao valor de mercado dos bens ou serviços, entendido como o valor praticado em operações comparáveis entre partes não relacionadas. O valor de mercado será aplicado quando a operação não tiver valor, o valor for indeterminado ou não representado em dinheiro, ou quando se tratar de operação entre partes relacionadas. Essa regra combate subfaturamento e operações simuladas com finalidade de reduzir carga tributária.
Alíquotas estimadas e o debate sobre carga tributária
Embora não haja definição oficial das alíquotas de IBS e CBS, especialistas estimam que a alíquota padrão combinada fique entre 26,5% e 28%, o que tornaria o Brasil um dos países com maior alíquota de IVA do mundo. Para comparação, a média da União Europeia é de 21% e a média dos países da OCDE é de 19%.
Essa alíquota elevada gera debate intenso. Defensores da reforma argumentam que o sistema atual já possui carga tributária oculta equivalente ou superior, mas fragmentada em múltiplos tributos com recuperação parcial de créditos. A reforma implementou sistemática ampla de créditos, de forma que virtualmente todas as aquisições de bens e serviços gerarão créditos a serem descontados do IBS e da CBS devidos, o que torna a alíquota nominal enganosa quanto ao ônus tributário efetivo.
A alíquota padrão da CBS foi definida em 8,8%, enquanto a alíquota padrão do IBS será de 17,7%. Porém, esses valores são alíquotas de referência. Cada ente federativo poderá ajustar sua alíquota, aumentando ou diminuindo em pontos percentuais, ou ainda escolher não vincular sua alíquota à alíquota de referência. Como a competência do IBS é compartilhada entre estados e municípios, sua alíquota será a soma das alíquotas do estado e do município de destino da operação.
A Emenda Constitucional estabeleceu mecanismo de revisão obrigatória. Se a soma das alíquotas efetivas superar o teto estimado de 26,5%, o governo deverá propor ajustes para manter a neutralidade da carga tributária. Essa previsão visa garantir que a reforma não resultará em aumento da carga tributária agregada, embora setores específicos possam experimentar variações significativas.
Não cumulatividade plena e o novo sistema de créditos
A não cumulatividade é característica central do IVA e representa avanço monumental em relação ao sistema brasileiro atual, onde a recuperação de créditos é limitada, complexa e fonte de litígios intermináveis. No modelo proposto pela reforma, o crédito tributário só pode ser aproveitado se houver efetivo pagamento do IBS e da CBS. A apropriação dos créditos será feita por meio de sistemas eletrônicos integrados, permitindo a compensação apenas quando houver comprovação do pagamento do tributo.
Essa exigência de pagamento efetivo para gerar crédito marca diferença importante em relação ao modelo teórico puro de IVA por subtração, onde o crédito decorre do mero destaque na nota fiscal. O modelo brasileiro busca combater fraudes através de cadeias simuladas de notas fiscais, problema crônico no sistema atual especialmente em operações de ICMS.
O contribuinte no regime regular poderá aproveitar créditos do IBS e da CBS quando os débitos relativos às operações em que for o adquirente forem extintos, excetuando-se operações destinadas ao uso ou consumo pessoal. A comprovação da operação deve ser feita por meio de documento fiscal válido e confiável.
A amplitude do direito ao crédito representa mudança revolucionária. No sistema atual, diversas aquisições não geram direito a crédito de ICMS ou PIS/COFINS, como serviços de manutenção, energia elétrica para áreas administrativas, refeições fornecidas a empregados e dezenas de outras situações. No novo modelo, salvo exceções específicas previstas em lei, toda aquisição onerada por IBS e CBS gera direito a crédito correspondente.
Essa não cumulatividade plena produzirá efeitos econômicos profundos. Setores intensivos em insumos tributados, como indústria e construção civil, tenderão a experimentar redução de carga tributária efetiva. Setores de serviços com baixa intensidade de insumos, como consultorias e serviços profissionais, enfrentarão aumento de carga, pois embora tenham menos créditos a recuperar, estarão sujeitos a alíquota significativamente superior aos atuais 9,25% de PIS/COFINS e 2% a 5% de ISS.
Princípio do destino e fim da guerra fiscal
Com a reforma tributária, a tributação passa a ser feita no local de destino. Isso significa que o imposto será pago no estado onde o consumidor final está localizado, independentemente de onde o produto ou serviço foi gerado. Essa mudança fundamental encerra a guerra fiscal entre estados, que durante décadas concederam benefícios fiscais de ICMS para atrair investimentos, gerando distorções econômicas graves.
No sistema de tributação na origem, predominante no ICMS atual, o tributo é recolhido majoritariamente no estado produtor. Isso incentivava estados a concederem benefícios fiscais na esperança de atrair empresas, mesmo que a produção fosse destinada a consumidores em outros estados. Esse modelo gerava ineficiência econômica, pois decisões de localização industrial eram distorcidas por incentivos fiscais ao invés de refletirem vantagens logísticas, de infraestrutura ou de mercado consumidor.
Com tributação no destino, estados e municípios arrecadam conforme o consumo em seus territórios, alinhando interesse fiscal com desenvolvimento do mercado consumidor local. Empresas tomarão decisões de localização baseadas em fatores econômicos genuínos, e a competição entre entes federativos precisará ocorrer através de melhoria de infraestrutura, qualificação de mão de obra e ambiente de negócios, não através de renúncia fiscal predatória.
O período de transição ano a ano (2026 a 2033)
A complexidade do período de transição não pode ser subestimada. Durante oito anos, dois sistemas tributários completamente diferentes coexistirão, exigindo que empresas mantenham estruturas paralelas de apuração, recolhimento e documentação fiscal.
2026: Fase de testes
A partir de 2026, o IBS terá alíquota de 0,1% e a CBS de 0,9%, sendo dispensado o recolhimento para quem cumprir as obrigações acessórias previstas na legislação. O montante recolhido poderá ser compensado com PIS/COFINS ou com outros tributos federais, ou ressarcido em espécie.
Contribuintes que não cumprirem com todas as obrigações acessórias relativas aos novos tributos estarão obrigados a recolher a CBS e o IBS nesta fase teste. A penalidade consta do parágrafo 4º do artigo 125 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e do parágrafo 1º do artigo 348 da Lei Complementar 214/2025. Essa exigência cria incentivo poderoso para que empresas adaptem seus sistemas rapidamente, sob pena de arcarem com tributos que deveriam ser apenas teste.
Empresas optantes pelo Simples Nacional, MEIs e outros regimes diferenciados estão dispensados da apuração e do cumprimento das obrigações dessa fase piloto. Essa dispensa reconhece que pequenas empresas possuem menor capacidade de adaptação rápida a mudanças sistêmicas.
2027: Extinção de PIS e COFINS
Em 2027, o PIS e a COFINS serão extintos, dando lugar à cobrança efetiva da CBS com alíquota estimada em 8,7%. O IPI passará a ter alíquota zero, exceto para produtos industrializados na Zona Franca de Manaus. Em 2027 e 2028, o IBS será cobrado à alíquota de 0,1%.
Também em 2027 começa a ser instituído o Imposto Seletivo, de competência federal, com foco em produtos e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, tais como bebidas alcoólicas, cigarros e combustíveis fósseis. O Imposto Seletivo substitui parcialmente o IPI e adiciona camada extra de tributação sobre produtos considerados nocivos.
2028: Avaliação e ajustes
Em 2028, o governo fará avaliação de impacto na arrecadação para verificar a neutralidade fiscal, podendo ajustar alíquotas em 2029 se houver perda de receita para União, estados ou municípios. Esse ano representa momento crítico onde dados reais de arrecadação permitirão calibrar alíquotas antes da fase mais intensa de transição.
2029 a 2032: Transição progressiva do ICMS e ISS
O IBS começará a substituir o ICMS e o ISS de forma progressiva. Em 2029, ICMS e ISS serão reduzidos para 90% da alíquota atual e o IBS subirá para 10%. Em 2030, ICMS e ISS cairão para 80% e IBS subirá para 20%. Em 2031, ICMS e ISS ficarão em 70% e IBS em 30%. Em 2032, ICMS e ISS serão reduzidos para 20% e IBS atingirá 80%.
Essa transição gradual permite que estados e municípios ajustem suas finanças e estruturas administrativas sem choques abruptos de receita. Porém, para contribuintes, significa conviver com três tributos paralelos incidindo sobre as mesmas operações, cada um com suas regras de apuração, documentação e recolhimento.
2033: Implementação completa
Em 2033, chegamos ao fim da transição. O ICMS e o ISS deixam definitivamente de existir, e o IBS assume integralmente a tributação sobre bens e serviços de competência estadual e municipal. A CBS já estará totalmente implantada desde 2027.
Split payment e o fim da inadimplência estrutural
Uma das inovações mais significativas da reforma é o split payment, sistema em que a instituição financeira fica responsável por segregar o valor liquidado entre a parcela destinada ao Fisco e aquela destinada à remuneração do fornecedor. No momento em que o comprador efetua o pagamento, o banco já separa automaticamente o montante devido de tributos e o transfere diretamente para o Fisco, sem passar pelo fornecedor.
Esse mecanismo reduz drasticamente a possibilidade de inadimplência tributária. No sistema atual, empresas frequentemente utilizam recursos tributários para capital de giro, acumulando dívidas fiscais que posteriormente não conseguem pagar. Com split payment, o tributo nunca chega às mãos do contribuinte, impossibilitando seu uso para outros fins.
O contribuinte acessará todas as informações de apuração e pagamento em plataforma eletrônica unificada, com gestão compartilhada entre o Comitê Gestor do IBS e a Receita Federal. Essa plataforma única representa avanço monumental em relação ao cenário atual, onde contribuintes lidam com sistemas distintos da Receita Federal, de cada Secretaria Estadual de Fazenda e de cada Prefeitura.
Responsabilidade tributária e plataformas digitais
As plataformas digitais, ainda que domiciliadas no exterior, são responsáveis pelo pagamento do IBS e da CBS relativos às operações realizadas por seu intermédio em hipóteses específicas, solidariamente com o adquirente ou destinatário e em substituição ao fornecedor caso este seja residente ou domiciliado no exterior.
É considerada plataforma digital aquela que atua como intermediária entre fornecedores e adquirentes nas operações realizadas de forma não presencial ou por meio eletrônico e controla um ou mais elementos essenciais à operação, tais como cobrança, pagamento, definição dos termos e condições ou entrega.
Essa responsabilização de plataformas digitais visa combater evasão fiscal em operações de e-commerce, especialmente envolvendo fornecedores não estabelecidos no Brasil. Grandes marketplaces internacionais terão obrigação de reter e recolher tributos sobre operações que intermediam, garantindo arrecadação mesmo quando fornecedores estrangeiros não possuem estrutura no país.
Imunidades e reduções de alíquota
São imunes ao IBS e CBS os fornecimentos realizados pela União, estados, Distrito Federal e municípios, por entidades religiosas e templos de qualquer culto, por partidos políticos e suas fundações, entidades sindicais de trabalhadores e instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos, de livros, jornais e periódicos e do papel destinado a sua impressão, e de fonogramas e videofonogramas musicais produzidos no Brasil.
Além das imunidades, a legislação prevê alíquotas reduzidas para diversos setores. A cesta básica terá alíquota zero, ou seja, isenção total. Produtos como crustáceos, polpas de frutas, óleos vegetais e pães de forma terão redução de 60% na alíquota. Serviços de saúde, educação, transporte público coletivo e outros considerados essenciais também contarão com reduções significativas.
Essas diferenciações de alíquotas geram tensão com o princípio de simplicidade que fundamenta a reforma. Quanto mais exceções e tratamentos diferenciados, maior a complexidade operacional e maiores as oportunidades de litígio e planejamento tributário agressivo. O desafio será equilibrar objetivos de justiça social e proteção de setores sensíveis com a necessária simplicidade operacional.
Cadastro único e integração de dados
As pessoas físicas e jurídicas e entidades sem personalidade jurídica sujeitas ao IBS e CBS são obrigadas a se registrar em cadastro com identificação única. As informações cadastrais terão integração, sincronização, cooperação e compartilhamento obrigatório e tempestivo em ambiente nacional de dados entre as administrações tributárias federal, estaduais, distrital e municipais.
Esse ambiente nacional de dados representa infraestrutura tecnológica sem precedentes no Brasil. Pela primeira vez, União, estados e mais de 5.500 municípios compartilharão informações em tempo real através de plataforma integrada. A efetividade dessa integração será crítica para o sucesso da reforma, mas também levanta questões sobre privacidade, segurança de dados e capacidade técnica de municípios menores.
Desafios operacionais para empresas
A adaptação ao IBS e CBS exigirá investimentos significativos em tecnologia e capacitação. Contribuintes que não conseguirem emitir os documentos fiscais adaptados ao novo modelo ficarão impossibilitados de faturar e concluir operações, representando risco operacional grave.
Sistemas de gestão empresarial (ERPs) precisarão ser completamente reformulados. A apuração de tributos que hoje ocorre mensalmente com base em regime de competência dará lugar a apuração em tempo real vinculada ao efetivo pagamento das operações. Empresas precisarão repensar processos de precificação, gestão de fluxo de caixa e até mesmo estratégias comerciais.
O período de transição, com dois sistemas paralelos, multiplicará custos de conformidade no curto prazo, embora a promessa seja de redução significativa após 2033. Contribuintes terão que compatibilizar os desafios da implementação do novo sistema com os percalços do atual sistema, mantendo obrigações acessórias duplicadas.
Impactos setoriais diferenciados
Setores reagirão de forma heterogênea à reforma. Indústrias com longas cadeias produtivas e alta proporção de insumos tributados tenderão a se beneficiar da não cumulatividade plena, recuperando créditos que hoje são perdidos. Exportadores terão acesso simplificado a créditos acumulados, reduzindo resíduos tributários que hoje oneram suas operações.
Prestadores de serviços, especialmente serviços profissionais e intelectuais com baixa proporção de insumos, enfrentarão aumento significativo de carga tributária. Um escritório de advocacia ou consultoria que hoje recolhe 2% de ISS e 9,25% de PIS/COFINS passará a pagar alíquota combinada próxima de 28%, ainda que possa creditar-se de aluguéis, energia e outros gastos.
Varejo sofrerá impacto de precificação. A alíquota aparente mais alta exigirá comunicação cuidadosa com consumidores para evitar percepção de aumento de preços, mesmo que a carga tributária efetiva não tenha se alterado significativamente devido à recuperação de créditos que antes eram perdidos.
Contencioso administrativo e segurança jurídica
O contencioso administrativo do IBS será disciplinado por legislação específica aprovada pelo Congresso Nacional, enquanto o contencioso da CBS seguirá regido pela legislação federal já existente. Essa dualidade de processos administrativos para tributos tecnicamente idênticos gera questionamentos sobre eficiência e uniformidade de entendimentos.
A expectativa é de redução drástica da litigiosidade tributária após estabilização do novo sistema. Um dos objetivos centrais da reforma é proporcionar maior segurança jurídica, reduzindo litígios através de regras mais claras e consolidadas. O Brasil possui um dos maiores contenciosos tributários do mundo, com disputas que se arrastam por décadas em discussões sobre classificação fiscal de produtos, natureza de operações e direito a créditos.
Porém, no curto e médio prazo, a reforma gerará nova onda de litígios. Interpretações sobre regras de transição, definição de setores beneficiados por alíquotas reduzidas, alcance do direito ao crédito em situações específicas e aplicação de responsabilidade tributária criarão milhares de processos administrativos e judiciais.
A reforma como oportunidade estratégica
Apesar dos desafios, a reforma tributária oferece oportunidades para empresas que se prepararem adequadamente. Setores historicamente prejudicados por cumulatividade tributária poderão redesenhar cadeias produtivas e estratégias de precificação explorando a recuperação plena de créditos. Empresas exportadoras terão acesso mais rápido e seguro a ressarcimento de créditos acumulados, melhorando competitividade internacional.
A necessidade de reestruturação de sistemas e processos força modernização que muitas empresas vinham postergando. A integração de dados fiscais em ambiente nacional único, embora desafiadora, promete eliminar redundâncias e reduzir custos de conformidade no longo prazo.
A transparência do novo modelo, com tributos claramente destacados e carga tributária efetiva mais visível, pode estimular competitividade genuína baseada em eficiência operacional ao invés de engenharia tributária. Empresas que historicamente competiam através de acesso privilegiado a benefícios fiscais precisarão encontrar fontes sustentáveis de vantagem competitiva.
Considerações finais sobre IBS e CBS
O IBS e a CBS representam aposta na simplificação, modernização e alinhamento do Brasil às melhores práticas internacionais de tributação sobre consumo. O modelo busca simplicidade através da unificação de tributos, neutralidade pela eliminação de cumulatividade e efeitos em cascata, e transparência com maior clareza sobre tributos incidentes.
O sucesso dessa transformação dependerá de múltiplos fatores: capacidade do Poder Público de implementar infraestrutura tecnológica robusta e integrada, habilidade de empresas em adaptar sistemas e processos, efetividade do Comitê Gestor do IBS em harmonizar procedimentos entre milhares de entes federativos, e maturidade política para resistir a pressões setoriais por exceções que comprometeriam a simplicidade do modelo.
O período de transição até 2033 testará a resiliência de empresas e a competência administrativa do Estado brasileiro. Organizações que encaram a reforma como ameaça a ser evitada correm risco de obsolescência. Aquelas que a interpretam como inevitabilidade a ser dominada e explorada estrategicamente posicionam-se para prosperar no novo ambiente tributário que emergirá da mais profunda reforma fiscal da história republicana brasileira.
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